quarta-feira, 15 de julho de 2015

Os caminhos do universo da dança Butô

 Publicado por FJSP em Arte e Cultura
http://fjsp.org.br/agenda/percursos-do-buto/


O Butô foi conhecido pelo mundo como a dança das trevas (Ankoku Butoh) nos anos 60.

O mexicano Diego Piñón que foi discípulo de Kazuo Ohno, o japonês Kota Yamazaki que conheceu o Butô com Akira Kasai, e os brasileiros Emilie Sugai e José Maria Carvalho, ambos fortemente influenciados pelo diretor coreógrafo Takao Kusuno (1945-2001), o precursor do Butô no Brasil. Foi Kusuno quem concretizou a primeira turnê do Kazuo Ohno no País, em 1986, e também deixou sua marca através da Cia Tamanduá de Dança Teatro, com obras como a lendária obra “O Olho do Tamanduá”, em que explorou o encontro da expressão da cultura brasileira com o universo Butô, e que contou com Emilie Sugai e José Maria Carvalho no elenco, entre outros.

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Diego Piñón

Na peça “N’TANTUKU-ICHI – Buscando la huella amorosa/Looking for the trace of love” (2011), como um ritual contemporâneo de comunicação, com um título em língua mixteca, Diego Piñón expressa uma revolta sobre a ambivalência e a contradição da estrutura humana para sobreviver no contexto da masculinidade.
Seu estilo de dança é o resultado de mais de 35 anos de pesquisa em diferentes áreas: artística-terapêutica-artes cênicas, e partindo de uma investigação de suas raízes mexicanas, xamanísticas e de um treinamento mexicano energético, integrou a dança e o teatro até encontrar uma profunda conexão com o Butô de seus mestres, principalmente Kazuo Ohno, Yoshito Ohno, Natsu Nakajima, Min Tanaka, Mitsuyo Uesugi. Nomeia sua proposta singular de Butoh Ritual Mexicano, e desde 1994 tem se apresentado no México, Estados Unidos, Canadá, Europa e Japão, transmitindo um sentimento de transformação pessoal e integração coletiva através da abordagem do Ritual de Dança, como uma alternativa holística a serviço da expressão e punição humana. Piñón acredita que ao combinar diferentes realidades: mente, corpo, alma, como parte da manifestação do universo, a dança atingirá um novo nível de consciência, ultrapassando, assim, os padrões egocêntricos.
“Um dos elementos fundamentais desta proposta está relacionado ao trabalho coletivo, o ter sempre uma testemunha-receptora de nossos atos e explorações de tal forma que possamos transcender as respostas aprendidas e as reações cotidianas: nossa personalidade, que nos protege e que por sua vez nos aprisiona”, afirma Diego Piñón.


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Kota Yamazaki

Apresenta a peça “IRUKA” (2007), uma viagem entre dois elementos como ying e yan, mais e menos, ação e reação, e o efeito físico perturbador causado pelo cruzamento destes aspectos é a intenção da peça. O título significa “Você está aqui?”, mas também questiona “Para quê o corpo existe?”.
Nascido em Niigata, no Japão, graduou-se no Bunka Fashion College. Em 1977, conheceu e se aperfeiçoou no Butô com Akira Kasai. Foi o diretor artístico da companhia rosy co., de 1996 a 2001, desenvolvendo inúmeras obras em colaboração com artistas de diferentes áreas, como o arquiteto Toyo Ito. Em 2002 funda nova companhia, Kota Yamazaki/Fluid hug-hug, em Nova Iorque, apresentando-se em festivais como PICA/TBA, BAM Harvey Theater, Melbourne International Arts, entre outras. Leciona na Bennington College, Yotsuya Art Studium na Kinki University. No ano de 2007, recebeu, com Germaine Acogny, o prêmio The New York Dance and Performance Award (Bessie Award) pela coreografia de FAGAALA. Desde 2009 é o diretor do Body-Arts Laboratory e organiza o Festival Whenever Whenever em Tóquio. Em 2013, recebe o prêmio Foundation for Contemporary Arts Grant Award, nos Estados Unidos.
Fundado sob o lema “viagem, intercâmbio e pesquisa”, Kota Yamazaki/Fluid hug-hug tem recebido inúmeros convites para apresentações (Chicago Columbia College Dance Center, Global Dance Festival, Arizona State University, PICA; TBA Festival, University of Riverside, The NUS for the Arts, SPAC, Bank Art, Melbourne International Arts Festival, Dance Theater Workshop, Painted Bride Art Center, 92nd Street Y Harkness Dance Festival, Danspace Project, entre outros) e Yamazaki tem sido convidado para criação de obras inéditas para companhias dos Estados Unidos, Japão, Coreia, Austrália, Canadá e Senegal.

“O butô nasceu da vanguarda no Japão e, desde então formaram-se muitos dançarinos de diversos estilos. O butô, na minha opinião, não requer um motivo, mas um corpo que preserve uma linguagem própria e não seja consumido”, diz Kota Yamazaki.


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Emilie Sugai

Na obra “LUNARIS” (2011), inspirado na poesia de Matsuo Bashô (1644-1694), Emilie Sugai cria uma interface de comunicação artística entre a linguagem do corpo e a imagem da lua, traduzindo-se em um ensaio poético narrado entre luzes e sombras.
Coreógrafa e intérprete, desenvolve uma linguagem própria e singular, em criações solos e em grupos, fruto de suas inquietações artísticas e de vida, geradas das influências recebidas de seu mestre Takao Kusuno (1945-2001) no período de 1991 a 2001, das pesquisas relacionadas às memórias do corpo, da ancestralidade e de colaborações com artistas da dança, teatro, cinema e videoarte.
Premiada com a Bolsa Vitae de Artes (1999) aprofundou as investigações relacionadas às memórias do corpo como nipo-brasileira, com a Bolsa UNESCO-Aschberg ministrou um ateliê coreográfico no Senegal, África, com dançarinos e percussionistas tradicionais senegaleses (2003), recebeu os Prêmios FUNARTE de Dança Klauss Vianna (2006/2007), Prêmio APCA como melhor concepção em dança em 2008, entre outros. 
Criou os espetáculos “Tabi” (2002), “Totem” (2004), “Intimidade das Imagens” (2006), “Hagoromo o manto de plumas” (2008), e, recentemente “Lunaris – o mundo que passa”(2011). Paralelamente participou de duas produções com consagrados diretores: “Foi Carmen Miranda” sob direção de Antunes Filho, uma homenagem a Kazuo Ohno em Yokohama-Japão (2005); e com a Cia. Pappa Tarahumara em Tóquio, Japão, na montagem do espetáculo “Heart of Gold”, baseado na obra Cem Anos de Solidão de Gabriel Garcia Marquez, sob direção do japonês Hiroshi Koike (2005). Com a Cia. Tamanduá de Dança Teatro fundada em 1995 sob direção de Takao Kusuno e Felicia Ogawa participou de diversos festivais internacionais de teatro (Alemanha, Cuba, Japão, Brasil), com os espetáculos “O Olho do Tamanduá” (Troféu Mambembe de Dança/1995) e “Quimera o anjo vai voando”(1999), a última obra de Kusuno.
“Caminhar lentamente deslizando, com todos os poros atentos, os pés firmes no chão e o olhar voltado para dentro. Dançar sem dançar, as mãos apoiadas no gesto. Expressar o binômio nascimento e morte: a própria vida. As marcas da personalidade e da história de cada um apagam-se com o branco que cobre o corpo todo. Fica a essência do vazio e o movimento do corpo a única linguagem. É isto que a arte butoh nos permite fazer, num caminho circular e espiralado, como dizia Takao Kusuno”, afirma Emilie Sugai sobre a sua dança Butô. 

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José Maria Carvalho

Na peça “Memória do Amanhecer” (1995), Carvalho propõe discutir a força do ciclo: vida, morte e renascimento. E em “Vaqueiro” (1995), o desafio é expressar forças paradoxais: as condições extremas da vida no lugar, a coragem e a brutalidade convivem com a paixão, a força e a suavidade na alma. A releitura das duas peças solo compõem Ciclo da Terra, que dedica uma homenagem a Takao Kusuno e Felícia Ogawa, com quem atuou na cia. Tamanduá de Dança Teatro, e que deixaram um legado de ensinamentos e exemplos de dedicação à arte do corpo, a dança e a vida, segundo Carvalho.
Dançarino, diretor, professor e pesquisador de dança, Carvalho vem desenvolvendo uma pesquisa de linguagem em dança, investigando a aplicação deste método na criação de parâmetros corporais, corpo de fluxo, habitado por intensidades, e que possibilite a criação de uma dança/acontecimento, dança do devir. Foi bailarino-intérprete do espetáculo “Cavaleiro da Rosa”, em 1987, com direção de Ivaldo Bertazzo. Entre 1992 e 1993, participa como dançarino criador de “Sáfara: Ciranda para uma Lua e Meia”, com direção de Denilto Gomes. Participa como interprete no projeto “Agosto”, em 2000, e Sofia Cavalcante, projeto que recebeu o Prêmio Estimulo FUNARTE. Em 2001, cria o espetáculo ‘Sollos”, com apoio do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). Em 2002, começa a pesquisa sobre a obra do escritor Guimarães Rosa, que culmina no espetáculo “100 Anos de Rosa”, apresentado na Galeria Olido, em 2008. Em 2003, participa da Bienal Internacional de Artes de Kyoto, Japão, com o espetáculo “O Olho do Tamanduá”, da cia. Tamanduá de Dança Teatro. Em 2010/2011, desenvolve a performance/pesquisa “Radiodança – pesquisa de linguagem”.
“Conheci a dança Butô com Takao kusuno. Seu modo singular de ver e viver a vida e pensar a arte. Por seu intermédio conheci Kazuo Ohno e sua dança da alma. Pura intensidade, ser de sensação. Com o grupo Tamanduá dei meus primeiros passos nesta longa jornada de vida/arte. Acredito na dança/Butô como uma arte que cria potência de vida. Vida criativa capaz de criar novos mundos.”, cita José Maria Carvalho.


Diego Piñón teve como mestre o Kazuo Ohno e explora suas raízes na cultura mexicana para as criações. Kota Yamazaki foi discípulo de Akira Kasai e experiencia o conceito de fluidez no encontro das pessoas enquanto dirige seu grupo de dança em Nova Iorque. E Emilie Sugai e José Maria Carvalho foram integrantes da Companhia Tamanduá de Dança Teatro dirigido por Takao Kusuno, o precursor do Butô no Brasil, e trilham seus caminhos com linguagens e expressões próprias. A vivência e o universo de cada um destes quatro intérpretes descrevem um panorama da dança Butô que se envereda pelo mundo.

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