Publicado por FJSP em Arte e Cultura
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O Butô foi conhecido pelo mundo como a dança das trevas (Ankoku Butoh) nos anos 60.
O mexicano Diego Piñón que foi discípulo de Kazuo Ohno, o japonês Kota Yamazaki que conheceu o Butô com Akira Kasai, e os brasileiros Emilie Sugai e José Maria Carvalho,
ambos fortemente influenciados pelo diretor coreógrafo Takao Kusuno
(1945-2001), o precursor do Butô no Brasil. Foi Kusuno quem concretizou a
primeira turnê do Kazuo Ohno no País, em 1986, e também deixou sua
marca através da Cia Tamanduá de Dança Teatro, com obras como a lendária
obra “O Olho do Tamanduá”, em que explorou o encontro da expressão da
cultura brasileira com o universo Butô, e que contou com Emilie Sugai e
José Maria Carvalho no elenco, entre outros.
Diego Piñón
Na peça “N’TANTUKU-ICHI – Buscando la huella amorosa/Looking for the
trace of love” (2011), como um ritual contemporâneo de comunicação, com
um título em língua mixteca, Diego Piñón expressa uma revolta sobre a
ambivalência e a contradição da estrutura humana para sobreviver no
contexto da masculinidade.
Seu estilo de dança é o resultado de
mais de 35 anos de pesquisa em diferentes áreas:
artística-terapêutica-artes cênicas, e partindo de uma investigação de
suas raízes mexicanas, xamanísticas e de um treinamento mexicano
energético, integrou a dança e o teatro até encontrar uma profunda
conexão com o Butô de seus mestres, principalmente Kazuo Ohno, Yoshito
Ohno, Natsu Nakajima, Min Tanaka, Mitsuyo Uesugi. Nomeia sua proposta
singular de Butoh Ritual Mexicano, e desde 1994 tem se apresentado no
México, Estados Unidos, Canadá, Europa e Japão, transmitindo um
sentimento de transformação pessoal e integração coletiva através da
abordagem do Ritual de Dança, como uma alternativa holística a serviço
da expressão e punição humana. Piñón acredita que ao combinar diferentes
realidades: mente, corpo, alma, como parte da manifestação do universo,
a dança atingirá um novo nível de consciência, ultrapassando, assim, os
padrões egocêntricos.
“Um dos elementos fundamentais desta
proposta está relacionado ao trabalho coletivo, o ter sempre uma
testemunha-receptora de nossos atos e explorações de tal forma que
possamos transcender as respostas aprendidas e as reações cotidianas:
nossa personalidade, que nos protege e que por sua vez nos aprisiona”,
afirma Diego Piñón.
Kota Yamazaki
Apresenta a peça “IRUKA” (2007), uma viagem entre dois elementos como
ying e yan, mais e menos, ação e reação, e o efeito físico perturbador
causado pelo cruzamento destes aspectos é a intenção da peça. O título
significa “Você está aqui?”, mas também questiona “Para quê o corpo
existe?”.
Nascido em Niigata, no Japão,
graduou-se no Bunka Fashion College. Em 1977, conheceu e se aperfeiçoou
no Butô com Akira Kasai. Foi o diretor artístico da companhia rosy co.,
de 1996 a 2001, desenvolvendo inúmeras obras em colaboração com artistas
de diferentes áreas, como o arquiteto Toyo Ito. Em 2002 funda nova
companhia, Kota Yamazaki/Fluid hug-hug, em Nova Iorque, apresentando-se
em festivais como PICA/TBA, BAM Harvey Theater, Melbourne International
Arts, entre outras. Leciona na Bennington College, Yotsuya Art Studium
na Kinki University. No ano de 2007, recebeu, com Germaine Acogny, o
prêmio The New York Dance and Performance Award (Bessie Award) pela
coreografia de FAGAALA. Desde 2009 é o diretor do Body-Arts Laboratory e
organiza o Festival Whenever Whenever em Tóquio. Em 2013, recebe o prêmio Foundation for Contemporary Arts Grant Award, nos Estados Unidos.
Fundado sob o lema “viagem, intercâmbio e pesquisa”, Kota
Yamazaki/Fluid hug-hug tem recebido inúmeros convites para apresentações
(Chicago Columbia College Dance Center, Global Dance Festival, Arizona
State University, PICA; TBA Festival, University of Riverside, The NUS
for the Arts, SPAC, Bank Art, Melbourne International Arts Festival,
Dance Theater Workshop, Painted Bride Art Center, 92nd Street Y Harkness
Dance Festival, Danspace Project, entre outros) e Yamazaki tem sido
convidado para criação de obras inéditas para companhias dos Estados
Unidos, Japão, Coreia, Austrália, Canadá e Senegal.
“O butô nasceu da vanguarda no Japão e, desde então formaram-se
muitos dançarinos de diversos estilos. O butô, na minha opinião, não
requer um motivo, mas um corpo que preserve uma linguagem própria e não
seja consumido”, diz Kota Yamazaki.
Emilie Sugai
Na
obra “LUNARIS” (2011), inspirado na poesia de Matsuo Bashô (1644-1694),
Emilie Sugai cria uma interface de comunicação artística entre a
linguagem do corpo e a imagem da lua, traduzindo-se em um ensaio poético
narrado entre luzes e sombras.
Coreógrafa e intérprete, desenvolve
uma linguagem própria e singular, em criações solos e em grupos, fruto
de suas inquietações artísticas e de vida, geradas das influências
recebidas de seu mestre Takao Kusuno (1945-2001) no período de 1991 a
2001, das pesquisas relacionadas às memórias do corpo, da ancestralidade
e de colaborações com artistas da dança, teatro, cinema e videoarte.
Premiada com a Bolsa Vitae de Artes
(1999) aprofundou as investigações relacionadas às memórias do corpo
como nipo-brasileira, com a Bolsa UNESCO-Aschberg ministrou um ateliê
coreográfico no Senegal, África, com dançarinos e percussionistas
tradicionais senegaleses (2003), recebeu os Prêmios FUNARTE de Dança
Klauss Vianna (2006/2007), Prêmio APCA como melhor concepção em dança em
2008, entre outros.
Criou os espetáculos “Tabi” (2002),
“Totem” (2004), “Intimidade das Imagens” (2006), “Hagoromo o manto de
plumas” (2008), e, recentemente “Lunaris – o mundo que passa”(2011).
Paralelamente participou de duas produções com consagrados diretores:
“Foi Carmen Miranda” sob direção de Antunes Filho, uma homenagem a Kazuo
Ohno em Yokohama-Japão (2005); e com a Cia. Pappa Tarahumara em Tóquio,
Japão, na montagem do espetáculo “Heart of Gold”, baseado na obra Cem
Anos de Solidão de Gabriel Garcia Marquez, sob direção do japonês
Hiroshi Koike (2005). Com a Cia. Tamanduá de Dança Teatro fundada em
1995 sob direção de Takao Kusuno e Felicia Ogawa participou de diversos
festivais internacionais de teatro (Alemanha, Cuba, Japão, Brasil), com
os espetáculos “O Olho do Tamanduá” (Troféu Mambembe de Dança/1995) e
“Quimera o anjo vai voando”(1999), a última obra de Kusuno.
“Caminhar lentamente deslizando, com
todos os poros atentos, os pés firmes no chão e o olhar voltado para
dentro. Dançar sem dançar, as mãos apoiadas no gesto. Expressar o
binômio nascimento e morte: a própria vida. As marcas da personalidade e
da história de cada um apagam-se com o branco que cobre o corpo todo.
Fica a essência do vazio e o movimento do corpo a única linguagem. É
isto que a arte butoh nos permite fazer, num caminho circular e espiralado, como dizia Takao Kusuno”, afirma Emilie Sugai sobre a sua dança Butô.
José Maria Carvalho
Na peça “Memória do Amanhecer” (1995), Carvalho propõe discutir a força do ciclo: vida, morte e renascimento. E em “Vaqueiro”
(1995), o desafio é expressar forças paradoxais: as condições extremas
da vida no lugar, a coragem e a brutalidade convivem com a paixão, a
força e a suavidade na alma. A releitura das duas peças solo compõem
Ciclo da Terra, que dedica uma homenagem a Takao Kusuno e Felícia Ogawa,
com quem atuou na cia. Tamanduá de Dança Teatro, e que deixaram um
legado de ensinamentos e exemplos de dedicação à arte do corpo, a dança e
a vida, segundo Carvalho.
Dançarino, diretor, professor e pesquisador de dança, Carvalho vem
desenvolvendo uma pesquisa de linguagem em dança, investigando a
aplicação deste método na criação de parâmetros corporais, corpo de
fluxo, habitado por intensidades, e que possibilite a criação de uma
dança/acontecimento, dança do devir. Foi bailarino-intérprete do
espetáculo “Cavaleiro da Rosa”, em 1987, com direção de Ivaldo Bertazzo.
Entre 1992 e 1993, participa como dançarino criador de “Sáfara: Ciranda
para uma Lua e Meia”, com direção de Denilto Gomes. Participa como
interprete no projeto “Agosto”, em 2000, e Sofia Cavalcante, projeto que
recebeu o Prêmio Estimulo FUNARTE. Em 2001, cria o espetáculo ‘Sollos”,
com apoio do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). Em 2002, começa a
pesquisa sobre a obra do escritor Guimarães Rosa, que culmina no
espetáculo “100 Anos de Rosa”, apresentado na Galeria Olido, em 2008. Em
2003, participa da Bienal Internacional de Artes de Kyoto, Japão, com o
espetáculo “O Olho do Tamanduá”, da cia. Tamanduá de Dança Teatro. Em
2010/2011, desenvolve a performance/pesquisa “Radiodança – pesquisa de
linguagem”.
“Conheci a dança Butô com Takao kusuno. Seu modo singular de ver e
viver a vida e pensar a arte. Por seu intermédio conheci Kazuo Ohno e
sua dança da alma. Pura intensidade, ser de sensação. Com o grupo
Tamanduá dei meus primeiros passos nesta longa jornada de vida/arte.
Acredito na dança/Butô como uma arte que cria potência de vida. Vida
criativa capaz de criar novos mundos.”, cita José Maria Carvalho.
Diego Piñón teve como mestre o Kazuo Ohno e explora suas raízes na
cultura mexicana para as criações. Kota Yamazaki foi discípulo de Akira
Kasai e experiencia o conceito de fluidez no encontro das pessoas
enquanto dirige seu grupo de dança em Nova Iorque. E Emilie Sugai e José
Maria Carvalho foram integrantes da Companhia Tamanduá de Dança Teatro
dirigido por Takao Kusuno, o precursor do Butô no Brasil, e trilham seus
caminhos com linguagens e expressões próprias. A vivência e o universo
de cada um destes quatro intérpretes descrevem um panorama da dança Butô
que se envereda pelo mundo.
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