sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Artigo : "DANÇA - TERAPIA SEM FALA!"

Por: Mahaila Diluzz

Quando nos movimentamos, fazendo e refazendo o mesmo caminho corporal, repetido há milhares de séculos por nossas ancestrais, será que é só a forma física que dança?
Pense bem, o que somos? Um conjunto de células, órgãos, moléculas... Sensações, sentimentos, pensamentos...
Então, quando nosso corpo redesenha as formas de uma geometria ancestral, temos sensações, lembranças, sentimentos...
É incrível como a Racks El Shark (dança do leste), mais conhecida como dança do ventre, consegue soltar, desmembrar, desmanchar para esculpir novamente os corpos que nos formam. Costumo dizer que a dança do leste é uma terapia que começa a partir do corpo. Sem o uso da fala, a estrutura dos movimentos vai imprimindo uma nova dimensão na vida de quem dança. Para muitas pessoas, este processo silencioso através do corpo causa estranhamento. Percebemos as mudanças ocorrendo internamente, modificando nossa frequência vibracional, o que provoca transformações na nossa maneira de agir, pensar e sentir o mundo. Silenciosamente, à medida que nosso corpo se solta, se desprende de um padrão antigo, as nossas couraças vão aparecendo, resistentes em nos abandonar. Quando temos esta percepção, temos também uma escolha a fazer: continuar a nos oportunizar uma redescoberta, ou ficarmos paralisadas, sem seguir adiante. Estes são momentos que se repetirão inúmeras vezes, dentro do processo de quem dança a dança do leste. Cada bloqueio existente no corpo emocional que encontra o seu correspondente no corpo físico, desencadeará uma crise, um caos, uma barreira a ser vencida. Mas por que isto ocorre? Creio que uma das razões deva-se ao fato de utilizarmos na geometria dos movimentos uma linguagem ancestral ditada pelas formas, ritualisticamente, desenhadas por nosso corpo através da dança - desde a postura, que exige a abertura da caixa torácica, a expansão ou alongamento do chakra solar (altura do estômago) e o encaixe do quadril, que traz de volta para a bacia, sua primordial função de acomodar os órgãos internos. Ora, adotando-se esta postura, um corpo que antes passava a ideia de um Ser contido, agora nos parecerá uma pessoa autoconfiante, aberta para o mundo. Tomada esta postura inicial, damos início à re-apropriação de nosso corpo, aprendendo a isolar os movimentos de cada um dos membros. Isto fará com que cada estrutura física que abriga um dos chakras principais desenvolva sua função.
 Aprendendo a isolar os membros inferiores (movimentos de pés, pernas, joelhos, coxas, glúteos e pélvis), dos membros superiores (abdome, peito, braços, mãos, pescoço e cabeça), estaremos gerando energia, o que fará com que os chakras correspondentes respondam a este estímulo.
A geometria implícita - Mas, então, qualquer movimento ou dança podem fazer isto? Este é o fundamento de diversas terapias energéticas e corporais. Porém, estamos falando da Racks El Shark. Nela, há um detalhe que faz toda a diferença: "as formas desenhadas." Aqui entra o que alguns denominam de Geometria Sagrada, presente em tudo o que tem vida no universo. Esta geometria, que é a linguagem ancestral para a compreensão da natureza, está implícita na dança do ventre. Nossa compreensão primária sobre o mundo físico está nas formas. Nossos ancestrais desenhavam formas geométricas nas paredes das cavernas, procurando reproduzir o mundo em que viviam. Não compreendiam a matemática, mas sabiam que a lua era um círculo, e assim a representavam em suas esculturas rupestres. Assim sendo, os movimentos da dança não são só técnicos, pois partem do inconsciente para o consciente. Ritualisticamente, desenhamos círculos, movimento marcadamente feminino, de natureza Yin, introspectiva, uterina. Desenhamos retas formando triângulos sobrepostos e quadrados, movimentos Yang, fortes, e que demonstram segurança, dinamismo e poder.  Ritualisticamente também, desenhamos ondulações em oito, símbolo do infinito, presente nas formas microscópicas e que lembram as elipses dos átomos de energia - movimento que trabalha a nossa dualidade, os opostos, unindo nosso lado sombra a nosso lado luz. Quando o culto à fertilidade teve início, nos primórdios do período neolítico, provavelmente os povos desconheciam esta ciência, oculta na matemática das formas geométricas. Porém, a prática da dança, aliada ao culto à Deusa-Mãe, fez emergir a sabedoria embutida em seus ritos. E assim, atravessando o tempo, repetimos os mesmos movimentos que fazem surgir das profundezas, qual lótus em meio à lama, a luz mais plena de nossas almas femininas.

Mahaila DiluzzBailarina, coreógrafa e professora de Dança do Ventre e World Dance -Tribal mahailadiluzz@hotmail.com Porto Alegre/RS 


Fonte: http://mahailadiluzz.blogspot.com.br/2008/10/dana-terapia-sem-fala.html



Um pouco sobre Jamila Salimpour

Jamila Salimpour é uma das pioneiras da dança do ventre na América. Ela nada mais é do que a criadora do estilo tribal de dança do ventre e foi uma figura influente no mundo bellydancer por 50 anos! Sua forma de ensino e de desenvolvimento dos movimentos de dança ainda é utilizada em todo o mundo.

Nascida em 1926 em Nova York, de família siciliana, começou sua carreira como dançarina em 1942, trabalhando no grupo Ringling Brothers Circus. Neste grupo, ela desempenhou o papel de acrobata e dançarina, passando a compor em seu show elementos da dança oriental, influenciada por um filme de Tahia Carioca, o que para a audiência era como a verdadeira dança do ventre. Esta fusão de elementos orientais e o circo deu origem ao American Tribal Style (o que seria o estilo tribal que conhecemos), o qual ela começou a ensinar na década de 60, em Berkley. Em 1968, ela criou o grupo Bal Anat (Dança da Deusa Mãe), se apresentando no festival Renaissance Pleasure Faire, mostrando ao mundo uma forma diferente da tradicional dança do ventre de então, com grupos coreografados, compondo uma atmosfera mística, usando cobras, espadas, tatuagens, todo tipo de adereços: era a dança do ventre performática (American Cabaret), da qual Jamila era uma das precursoras.

Após esse festival, seu nome só cresceu, se tornando uma referência para a dança do ventre americana. Sua família passou também a se dedicar à dança do ventre: sua filha, Suhaila Salimpour começou a dançar aos 3 anos de idade, e hoje é uma dançarina renomada, e sua neta Isabella parece percorrer o mesmo caminho. Jamila, já com 83 anos, não mais se apresenta em shows, mas oferece workshops e aulas de American Tribal Style na escola de sua filha, permanecendo como um ícone da dança do ventre em todo o mundo.

terça-feira, 24 de setembro de 2013

"HISTÓRIA E FUNDAMENTOS ESTÉTICOS DO TRIBAL FUSION BELLYDANCE "




É na ritualística tribal feminina dos povos orientais que na verdade se encontra o ponto de partida para se pensar os fundamentos estéticos do Tribal Fusion Bellydance. Até aí para nós tribalistas nenhuma novidade! Contudo, essa obviedade teórica a qual é sempre mencionada e discursada por nós (bailarinas) àqueles que não conhecem o tribal, pode soar como um código interno intangível dada sua riqueza de fatos, nomes, datas, movimentos e estilos, portanto, cabe sempre chamar a digna atenção para tradição dessa arte que não sendo milenar chama-nos ao berço das manifestações grupais étnicas. E também que para os que se estão iniciando nos estudos tribalísticos e procuram saber de seus fundamentos achem sempre as informações sobre os antepassados dessa dança tão curiosamente envolvente e instigante, é que cumprimos o ofício ético de cada uma, de repassar o saber a quem quer conhecer, por que imergir na sua História e saber-lhe a verdade, dançá-la é dá-se à compreensão.

A História do Fundamentos Estéticos do Tribal se inicia por volta de 1960 com a bailarina Jamila Solimpour que fez diversas viagens à países do Oriente (mais precisamente desertos, áreas vizinhas e também povos da Índia, ou seja, mais antigos que não haviam cedido a aculturação promovida pelo capitalismo), durante essa temporada, ela começou a observar que mesmo as culturas que jamais haviam mantido alguma espécie de contato entre si (na maioria ainda nômades), conservavam curiosa semelhança ritualística, em especial no que dizia respeito às danças comemorativas e rituais (tais como os de fertilidade - razão pela qual a Dança do Ventre sempre termina sendo associada à sensualidade e tomada como ferramenta de sedução), dada a constatação de tantas semelhanças a bailarina começou a elaborar uma profunda pesquisa a fim de catalogá-las em estilos: Dança da Cimitarra, o Flamenco Cigano, a Dança Indiana, Danças Folclóricas Étnicas, Dança do Ventre, Danças Islâmicas do Tajiquistão, Dança Tailandesa, Dança das gueishas japonesas e Danças Tribais da África Central, etc. Finda a pesquisa Solimpour arquitetou um estilo de dança que englobava "os modus operantis" comuns a essas tribos criando um estilo de congregação, surge o que chamaríamos de "tribal primitivo", divulgando esse trabalho através da troupe Bal Anat.

Anos depois na década de 80 Carolena Nericcio que apesar do que se acredita, pois ela não foi aluna de Solimpour, na verdade nem chegou a conhece-la elaborou uma releitura do trabalho da mestra, criando aquele que viria ser chamado de ATS (American Tribal Fusion), que consistia da execução de passos comuns ao folclore das danças tribais sem uso de coreografia, o passos deveriam ser conhecidos pelas as integrantes da troupe, bem como deveriam ser de seu domínio a leitura de um jogo altamente específico dos sinais que indicavam cada líder da dança e o passo seguinte a ser executado. Nericcio não apenas dedicou-se a fazer a apreciação da dança e da musicalidade, mas também do vestuário desses grupos (tipicamente orientais, não utilizando a gama de objetos industrializados utilizados na Dança do Ventre Moderna – Estilo Cabaret – que ficou conhecido no mundo inteiro através da época dourada do cinema na Hollyowd das décadas de 30 e 40), e mais uma vez foi buscar aquilo que os identificava originalmente, ensinando e levando ao conhecimento do público esse trabalho através da troupe Fat Chance Bellydance. Ainda assim o ATS não pode ser designado como uma dança folclórica haja vista que não possui uma raiz natural; pois, o ATS é sim, fruto de pesquisa e catalogação, se instaurando como um “Estilo Tribal Folclórico Interpretativo”, mas que de qualquer forma é uma clara e evidente a necessidade anscentral de agrupamento visando união e evocação dos arquétipos femininos antigos, unindo os conceitos que dantes eram parte fechada, de rituais secretos que sairiam da ordem "templária" para as cerimônias públicas, como por exemplo de casamento e diversas festividades.

Outra característica é que essas danças não só tinham por intenção manifestar religiosidade, mas de promover a união e manutenção dos clãs femininos, a medida que mulheres tinham que se submeter a obediência de um "senhor" em grupo, e se o era que ao menos se suportassem! Pode parecer um pouco radical, mas imginem 5 esposas "de" um marido só vivendo numa casa! É pra destelhar qualquer telhado!!! As festas fechadas onde se enfeitavam e dançavam para si mesmas, estreitavam os laços de afetividade que poderiam se desgastar em nome da competição pela atenção do senhor (marido), deixando claro que toda manifestação cultural por mais que aparente certa inocência ou caráter mítico superior, geralmente tem também uma veia profunda e controversa, possuindo função sua social bem definida. O que aparece de forma muito interessante no tribal é que seus aspectos estéticos conseguem de modo latente superar os ditames impostos pela cultura, não é belo só por que pertence a cultura e segue o costume, não existem cânones pré-definidos, é belo indeterminado, por que fascina, e vai além do que a razão possa explicar, opera uma síntese mística não-sobrenatural, música-corpo-bailarina, não existem partes, vê-se mesmo o espírito em movimento, é alma que dança.

Mas o processo de evolução do Tribal não cessou, na década de 90 Rachel Brice aluna de Shuhaila Solimpour (filha de Jamila) e de Carolena Nericcio imprimiu ao estilo a força do tempo e do progresso, utilizando-se de ritmos musicais modernos como: Hip-hop, Trance, Noise Music, Rock entre outros, criando uma nova série de cadências e movimentos que caracterizam o Tribal Fusion Bellydance, apesar de embutir a música moderna à antiga, os passos tendem a evidenciar-se ainda mais voltados à origem, os movimentos prezam pela força da terra e a suavidade sinuosa das serpentes “o charme da serpente” (snake charmer) Rachel junto às bailarinas Zoe Jakes e Mardi Love integram hoje e troupe The Indigo, com coreografia que vão de um polo à outro entre o antigo, contemporâneo e teatral. As tribos hoje são muitas e diversificadas. O que se sobressai é, a captação a força essencial contida nessas imagens, foi dessa sensação acidental ao fazer uma pesquisa sobre danças tribais que se pode observar outra coisa muito mais intrigante, e contraditoriamente implícita em toda sua exploração. A pobreza do mito de beleza postado à mulher no Ocidente. Por que nos damos ao trabalho de fazer tal afirmação?! Afinal de contas, não é nenhuma novidade que a beleza não é algo exterior, é sim uma idéia, e qualquer forma de representação remete apenas aos arquétipos desse conceito universal.

A beleza é da alma, insistimos em dizer assim "alma" porque o desejo é aceder ao aquértipo, à idéia; a técnica é objeto, mas o objeto é trocado pela emoção não se extinguindo na mera sensação, é bruxaria e encanto, ora? Bruxas? Sim... A invocação é pagã de braços para o alto, não tem nome ou cor, é feita de ar e terra, serpenteia pela luz da imaginação, baila nas mãos endeusadas das mulhures mortais, bruxas! Não era isso que a inquisição dizia das bacantes que dançavam nuas nas florestam?! Possuídas sim! Mas não de espíritos maléficos, possuídas da fome de viver, essa é a divindade interna de cada uma, bruxas que não seres exóticos, estranhos, são àquelas que se reconhecem intimamente fêmeas e como tal se deixam tocar pelo dom da natureza, pela ligação inexplicável de sentidos e concepção, somos um bando! Somos o espírito das lobas que uivam na noite se reconhecem pela dança, a modernidade vem apagando e tirando isso da maioria das mulheres como exigência da massificação. Se vêem e se solicitam como objetos, são a refeição de estômagos furiosos, então as bacantes que sejam elas todas bruxas! Bruxas serão! Bruxas repito! Que dancem a melodia dissonante da lua internecida, sem saber o que é bem, sem separar o que é mal. Quer saber o que é ser tribalista? Dance!
Parte deste texto pode ser vista no vídeo: O que é Tribal Fusion - Realizado para o Interdepartamental do NUCFIRE - Faculdade Frassinetti do Recife.


 Retirado de:
http://aquariustribalfusion.blogspot.com.br/2009/08/historia-e-fundamentos-esteticos-do.html